"Não acrescentemos dias à nossa vida, mas vida aos nossos dias"
Segunda-feira, 24 de Abril de 2006
De Volta Com "Notas Mentais"

Boas (ons) (seja dia, tarde ou noite)! Peço desde já perdão pela minha ausência, (se é que alguém reparou) mas, impelido por outros, meti-me num projecto e tentei escrever um livro.

O meu pai sempre me disse que para semos homens de verdade tínhamos de plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro; ora a primeira já está, a segunda é para mais tarde e já adiantei a terceira.

Vou aqui publicá-la em três partes. Aqui vai a primeira, espero que gostem:

Notas Mentais

Capítulo I: Andar, falar, aprender…

 

Ouve-se um choro repentino de uma criança acabada de nascer, num dia de extremo calor de Agosto, que interrompe os gritos desesperados de uma mulher e toma de assalto a expectativa de um homem, que já gastou o chão da sala de espera do hospital só de andar de um lado para o outro.

- Parabéns, é um menino perfeitamente saudável! Como o vai chamar? – pergunta o médico à mãe a seguir de ter respirado fundo depois de um parto difícil.

- Ricardo Jorge da Fonseca Ferreira, sim; Ricardo Jorge é o nome do meu filho! – responde ofegantemente a recente mãe.

 

 

“Que se passa? Quem são estas pessoas todas a olhar para mim e a sorrirem para mim, a me beijarem, a me segurarem? Que se passa? Porque só falam de mim? Alguém faz anos hoje? Oiço milhentas pessoas a desejarem parabéns a alguém…

Mãe? És tu? Sim, és tu! Consigo senti-lo; nos teus braços sinto-me quente e confortável, como se nunca tivesse saído de dentro de ti. Finalmente alguém que eu reconheço!

Quem me toca na mão? Pai? Claro, és tu! Sinto-me seguro ao simples tocar das tuas grandes mãos; só podes ser tu!

Consigo ver a felicidade nos vossos olhos, é impossível não a ver! Quase que a toco e a meto à boca! Mãe, tu com esses olhos verdes, quase que me vejo neles, como se fossem um espelho, das lágrimas de alegria que vertes! E tu, pai, esse sorriso torna-se inevitável para ti. Fazes-me caretas das mais absurdas que existem, só para me veres sorrir!

Mas falta-me qualquer coisa…não consigo perceber o que será, talvez porque apenas tenho minutos de vida…mas sei que me falta qualquer coisa dentro de mim….dentro da minha personalidade, dentro da minha alma…

Descubro depois porque agora vou começar a chorar…só me entendem dessa forma, tento falar mas não consigo. Com o tempo devo conseguir. Por agora já percebi que para me deixarem dormir, comer ou brincar preciso de chorar, chorar bem alto!”

 

Ouvem-se mais berros bem altos que afastam toda a gente daquele quarto de hospital apertado. Finalmente, o recém-chegado pode descansar, protegido e amado pelos pais.

 

 

 

 

O rapaz, tão inquiridor, tem agora 6 anos e vai ter a terrível experiência, para quase todos, do primeiro dia de aulas. Depois de três anos comutando entre a casa dele, a casa dos avós maternos, sítio onde ele passa os dias enquanto os seus pais arranjam como apressar o fim do mês, e a casa da avó paterna; depois de ter passado por um sem número de colégios pré-escolares sem sucesso, isto é, sem permanecer aí mais de três meses sem adoecer e praticamente implorar para voltar para casa dos avós; está na hora de este menino ir para a primária.

 

 

 

- Não quero! Tenho medo! Os outros meninos não vão gostar de mim! Eu não quero!!! – Exclama o rapaz meio choroso.

- Vai, experimenta. Vais ver como vais fazer muitos amigos, vais aprender muitas coisas novas, e no fim do dia ainda vais agradecer aos teus pais por te terem posto na escola! – tenta acalmar desta forma a, sempre paciente, avó materna; a avó perto ,como ele lhe chama, por ser a avó que mora mais perto de casa dele.

- Só vou se tu vieres comigo! Preferia passar o dia contigo, a fazer desenhos contigo e todas as outras brincadeiras que sempre fazemos!!

- Fazemos isso tudo quando voltares da escola, temos tempo e na escola vais fazer muitas outras brincadeiras que até vais achar melhores do que as que fazemos.

- Não, não vou! Não vais estar a brincar comigo, deixa de ser o mesmo! Deixa-me ir para casa, eu quero ir para casa contigo! – Começa, assim, a chorar.

- Acalma-te meu querido. Vá, eu entro contigo na sala, deixo-te bem acomodado, falo um pouco com a tua professora e depois logo vemos se fico contigo ou não, combinado? – Sempre tão paciente, a avó.

- Está bem. – A avó conseguiu, agora o rapaz fica mais confiante depois do “acordo” e deixa de soluçar.

- Com licença…é aqui a sala do primeiro ano? – tenta saber se é a sala certa, a avó.

- É sim. E este deve ser o Ricardo? – pergunta retoricamente a professora do menino assustado. Ele ainda se assustou mais pelo facto dela saber o seu nome mas nunca terem sido apresentados – Eu sou a professora Alice. Estás bom Ricardo?

- Es…tou… - hesitante, o menino responde acenando com a cabeça, ainda está meio a soluçar.

- Então, não estejas triste. Aposto que quando os outros meninos e meninas chegarem tu vais ficar logo logo muito entusiasmado! – tenta apaziguar o menino.

- Talvez… - hesitante, o Ricardo olha em sua volta e “tira as medidas” à sua futura sala de aula, onde ele passará muito tempo. Ele fica contente com a sala, é acolhedora, com ar de nova e tem a um canto um tapete com algumas almofadas, brinquedos e livros. Começa a pensar que se calhar não vai ser assim tão mau.

 

“Eu percebo que tenho de vir para a escola, afinal não sei nada de nada…pronto exagero, sei alguma coisa, mas nada de muita relevância. A escola vai-me fazer bem. Aprenderei muitas coisas e conhecerei muitas pessoas, com as quais farei amizades.”

 

Chegam então os outros alunos. Na sua grande maioria estão todos tal e qual o Ricardo: com medo, os olhos vermelhos de chorarem e de mãos dadas com um parente.

Passado um pouco, alguns começam a cumprimentar os outros.

 

- Olá. – diz a Rita ao Ricardo.

- Olá... – responde Ricardo olhando para a sua avó.

- Olha querido, vou falar com a tua professora está bem? Fica aqui com esta menina simpática. – afasta-se a avó na tentativa de deixar que os dois se conheçam. Pode ser que o Ricardo se relaxe mais.

- Como te chamas?

- Ricardo…e tu?

- Rita! Estás bom? – pergunta a Rita.

- Não. Deveria estar agora a brincar com a minha avó em casa, mas tenho de estar aqui… - suspira o menino.

- Eu percebo-te…Eu também preferia estar com a minha irmã mais velha. Ela é muito engraçada! – sorri a Rita, talvez a relembrar-se de uma das caretas que a sua irmã faz. – Mas isto não deve ser assim tão mau. A minha mãe disse-me que é na escola que nos tornamos crescidos! Vamos aprendendo muitas coisas e à medida que vamos aprendendo isso tudo, crescemos sem dar pelo tempo passar. Deve ser bom, então!

- Sim, não pode ser mau de todo.

 

“Esta menina é muito simpática, e esperta também! Estranho...acho-a muito parecida comigo, não fisicamente, mas parece que ambos pensamos de igual forma…”

 

 

- Rita, espera por mim! – grita o rapaz.

- Anda lá molengão! – adverte Rita -  É o primeiro dia de aulas e eu não quero chegar atrasada. Estou em pulgas para ver a escola nova!

- Não sei porque estás tão entusiasmada, estava muito melhor de férias!

- Pois, mas agora não somos só nós! Vamos conhecer muitos mais amigos. A minha mãe diz que é nestas idades que fazemos amizades para a vida…as da primária passam rapidamente. – sempre a citar a sua sábia mãe.

- “Passam rapidamente”? Então e a nossa? Conhecemo-nos no primeiro ano, vamos agora para o quinto e ainda nos falamos constantemente! Passámos as férias juntos!

- Pois mas a nossa é muito diferente… - a frase é acompanhada com um pequeno suspiro e um olhar.

 

“Não a percebo; constantemente ela emprega esta frase…acho que cada vez compreendo mais o meu pai quando ele diz ‘Ninguém percebe as mulheres”

 

- Deve ser, para nos continuarmos a ver há 4 anos.

- Vá, chega destas conversas de parvos…vamos entrar na escola, vamos começar a conhecer pessoas novas! – exclamou, muito entusiasmada, a Rita.

- Sim, vamos, mas sentas-te a meu lado na carteira certo? – perguntou Ricardo

- Claro. – tranquilizou-o.

 

Então, os dois entram na sua nova escola. É uma escola do ensino básico, que vai do 5º ano até ao 9º e é a melhor escola do concelho em termos de ensino, apesar de não ser propriamente rica…O pavilhão de educação física está velho e ainda tem o chão em tacos de madeira, os materiais escolares só são novos no edifício mais recente, porque nos outros está tudo antiquado, e mesmo no mais recente os materiais são poucos. Percebe-se logo à partida que esta escola é a melhor do concelho não porque tem as melhores condições, mas porque os docentes e não-docentes se esforçam imenso para dar a melhor das preparações para os seus alunos; não é à toa que todos os melhores alunos nas escolas secundárias nos arredores são provenientes desta!

 

- Oi! Então, estás bom? – começa, assim, Ricardo a fazer amizades.

- Yap! E tu? – responde, alegremente, Tiago.

- Também. Como te chamas?

- Tiago e tu?

- Ricardo… já percebi que esta escola é fixe… - tenta puxar conversa com o novo amigo.

 - Sim, deve ser. Conheces alguém daqui?

- Só conheço aquela rapariga, ali… - aponta para Rita – Ela era da minha turma na primária e continuámos amigos.

- Tens sorte. Eu já não falo com nenhum dos meus colegas da primária.

- Pois, costumam ser amizades que passam rapidamente. – repete as citações da mãe da Rita.

- Talvez…

- Gostas de jogar à bola? – continua a aprofundar a amizade com Tiago.

- Não muito, não sou muito bom e metem-me sempre à baliza.

- A mim também, mas continuo a gostar! Um dia vou ser muito bom! – sonha alto Ricardo.

- Espero que sim. Eu gosto mais de computadores. – entretanto toca a campainha - Bem, vamos para as aulas, acabou de tocar. Vais para que sala?

- Para a C2 e tu?

- Também vou para aí. Que bom, somos colegas de turma! Sentas-te ao meu lado na carteira? Não conheço mais ninguém…

- Desculpa, prometi à minha amiga que me sentava ao lado dela, ela fica sempre muito insegura no primeiro dia.

 

Passa então por eles a Rita já no meio de um grupo de 4 amigas a rir-se com elas. Ela diz ao Ricardo que não se vai sentar com ele e pede desculpa.

 

“E agora mais isto…cada vez a percebo menos, troca-me por um bando de novas amigas como se me tivesse conhecido à pouco…”

 

- Pelos vistos não é assim tão insegura. – diz Tiago para Ricardo, sorrindo.

- Pois…Então sentamo-nos os dois! Vá, vamos lá. Não quero chegar atrasado logo no primeiro dia.

 

 

Afastam-se os dois, muito contentes, ambos por terem feito um novo amigo, que não sabem eles, para a vida.

 

Capítulo II: Confusão “mentalo-armárica”

 

 

- Margarida, queres namorar comigo? – pergunta Ricardo a tremer…

- Sim! Agora sei que é um sim! – responde confiante Margarida.

 

“Finalmente, depois de três meses da minha primeira ‘tentativa’ ela diz-me que ‘sim!”

 

Margarida e Ricardo conheceram-se no 5º ano, na mesma turma, e desde do início que sempre foram excelentes amigos um para o outro, autênticos confidentes! Um dia, no início deste 7º ano, o Ricardo, envergonhado como ele é, entregou uma carta à Margarida que dizia: “Sabes, dou-me por feliz de ser teu amigo. És mesmo daquelas pessoas especiais! Mas eu gostava que fossemos mais do que amigos…queres namorar comigo?”

Ele próprio sabia que era uma cobardice entregar-lhe uma carta em vez de lhe falar na cara, mas o medo da negação foi maior e assim que ele lhe entregou a carta desatou a correr o mais rápido possível, fingindo-se surdo aos “ricardos” que Margarida gritava-lhe e aguardando a sua resposta no dia seguinte.

Mas no dia seguinte veio a palavra fatal, o “não”. E assim foi durante três meses nos quais Ricardo nunca desistiu de Margarida! Até a este dia, este belo dia em que a resposta finalmente mudou.

 

 

Passou-se um ano deste namoro, mas não resistiu a mais e acabou.

 

- Preciso de falar contigo. – murmura Ricardo à sua namorada, num tom pesaroso.

- Está bem, fala. – replicou Margarida. Ela já tinha previsto tal coisa, aquelas palavras não enganam ninguém e o Ricardo já andava diferente há um mês.

- Acho que não devemos continuar…não sei porquê mas já não sinto o que sentia por ti…a paixão acabou e não há amor por detrás dessa paixão que sustente este namoro…

- Não me deixes! – diz Margarida incrédula.

 

Margarida desata a chorar e abraça-se a Ricardo. Ela aproxima a sua boca da dele tentando roubar-lhe um beijo mas ele vira a cara…

 

“Desculpa…não sei o que se passa comigo…devo ser estúpido ao fazer-te juras de amor e depois vir com este discurso…não lhe devia ter virado a cara…que insensível!”

 

 

- Rita, não sei o que aconteceu comigo…tudo perdeu o sentido naquela relação… - tenta explicar Ricardo, usando Rita como confidente.

- Ás vezes acontece…as pessoas confundem amizade com amor…depois só existe paixão mas a paixão acaba, mais tarde ou mais cedo…a vossa durou um ano. – tenta consolar Ricardo que, apesar de ter sido ele a acabar tudo, se sente muito mal com ele mesmo.

- Acredito que sim…mas fui estúpido ao não prever isto…não lhe devia ter feito juras de amor e muito menos ter sido tão insensível da forma como acabei com ela…

- Acalma-te, dá tempo ao tempo e tu e ela esquecem tudo o que aconteceu neste dia e voltam a ser amigos – com esta frase, Rita consegue acalmar Ricardo que descansa a sua cabeça no colo dela.

 

“Não sei porquê, mas aqui sinto-me muito bem…com ela sinto-me muito bem. Nós pensamos de forma igual…que estranho…Ela sabe sempre o que dizer para me fazer sentir melhor. É tão carinhosa comigo.”

 

 

E assim aconteceu, passados poucos dias a amizade de Margarida e Ricardo superou qualquer mágoa, rancor ou culpa restantes daquele dia chuvoso, e agora, no 9º ano, continuam na mesma turma e muito amigos! Rita também continua com Ricardo na turma, sempre a apoiá-lo, sempre a ampará-lo.

 

- Hey Ricardo! – chama o Tiago.

- Então meu! Diz… - responde Ricardo

- Olha lá, reparei como a Rita e tu estão sempre juntos, muito amigos e tal… - começa a insinuar – Cá para mim vocês gostam um do outro…

- Que absurdo! Somos amigos há séculos! A nossa amizade é totalmente diferente!

- Pois, é exactamente isso que te estou a dizer…

- Oh! Nem vou ligar a essa ideia estúpida!

- Não é uma ideia, é uma constatação… - replica Tiago

- Okay! Nem vou ligar a essa “constatação” estúpida!

 

“Será que ele tem razão? Será que ela gosta de mim? Mais! Será que eu gosto dela? Será por isso que os meus relacionamentos até agora nunca duram? Porque eu gosto verdadeiramente dela? Não pode ser…conheço-a há tanto tempo, já teria dado por qualquer sentimento diferente…”

 

 

Afastam-se Ricardo, Tiago e Rita da escola. Ambos moram juntos uns dos outros mas Tiago é o primeiro a ficar pelo caminho.

 

- Bem, eu fico aqui. Até amanhã pessoal! – despede-se Tiago.

- Fica bem Tiago. – despede-se Ricardo.

- Adeus Titi! – despede-se à sua maneira; Rita tem uma alcunha para todos.

 

Instala-se um silêncio de cortar à faca pelo resto do caminho. Ricardo continua a pensar no que o seu amigo lhe disse…

 

- Então? O gato comeu-te a língua hoje, Ricky? – ri-se Rita.

- Não…apenas não há assunto… - diz Ricardo enquanto finge uma gargalhada ou outra para disfarçar os seus pensamentos.

- Está certo, então. É aqui que fico. Adeus adeus!

- Adeus Rita, adeus.

 

 

“…Será que ela reparou no que eu estava a pensar? Às vezes, não sei como, ela lê-me a mente e advinha exactamente no que penso. Tenho de tirar estes pensamentos da minha cabeça senão dou em louco! Não vou deitar ao ar a amizade que tenho com ela apenas porque outros dizem que parece que nos amamos…não!”

 

 

Enquanto os dois se afastavam ambos pensavam um no outro…Rita parece ter mesmo um poder sobrenatural, e quase que leu, tal e qual um livro aberto, a mente do Ricardo. Ele continuou com a mesma dúvida por muito e muito tempo. Passou a sua adolescência toda pensando, tentando esclarecer o que sentia, sempre ao lado de Rita. “Deus escreve direito por linhas tortas”, diz o povo e com muita razão, pois estes dois permaneceram sempre nas mesmas turmas, sempre vizinhos; sempre, literalmente, lado a lado. Isto só piorava o estado de Ricardo…a confusão no seu cérebro estendia-se para o seu coração.

Sempre que Rita lhe dizia que precisava de falar com ele, o seu coração batia os 200 km/h, e sentia sempre um frio na barriga, sempre na expectativa que essa conversa lhe dissipasse as dúvidas.

 

 

“Cada vez desejo mais que a expressão “idade do armário” passasse do papel para a realidade e que fechassem num armário até ela se esquecer de mim e assim eu também pudesse esquecê-la!

Todo o dia eu penso nela, seja por um lado ou por outro. Estar perto ou longe dela quase que se tornou na mesma coisa porque quando estou com ela, penso nela porque descubro qualidades novas todos os dias; quando estou longe dela não paro de pensar nela e de querer apressar o próximo encontro…Sonho com ela noite sim e na outra também…acho que uma vez até quando estava a fazer uma sesta pensei que teria sido acordado com um beijo dela...

A meio das aulas dou por mim a sussurrar o nome dela entre os meus suspiros…chamo a todos e mais alguns de Rita…Ela pôs-me louco…

E chego agora à conclusão definitiva de que…eu a amo…e este amor não é apenas mais um “amor”; uma paixão que desaparece com tanta facilidade como começa; um desejo unicamente carnal que até deprime…não…o que eu sinto por ela é a personagem principal de milhões de histórias; o que eu sinto por ela está ainda por ser explicado pela ciência; o meu sentimento pela Rita enlouquece sábios, é um vulto na vida real e uma presença bem assente nos contos de fadas! O que eu sinto por ela é amor verdadeiro, do mais puro que possa existir! Mas agora a pergunta que me assombra é: Porque é que tinha de sentir isto logo por ela? No meio de tantas raparigas, porquê ela? Nunca que eu tenho a mínima hipótese com ela! E não digo isto apenas por causa do físico, e que físico; digo isto porque ela merece um príncipe encantado, alguém que a faça flutuar de tanta felicidade…

Será a minha sina vagabundear-me por ela? Terei eu para sempre aprisionado a arrastar-me de amores pela Rita? Pela primeira pessoa que veio falar comigo na primária? Que ficou sempre do meu lado, sempre que eu precisava? Serei eu sortudo por ter encontrado a minha “alma gémea” ou deverão todos ter pena de mim por estar loucamente enamorado por um anjo?

Encontrei uma resposta que apenas me guiou a mais perguntas, cada uma mais tenebrosa que a outra…”

 

 

E foi sempre assim…Já há 10 anos…Ambos continuam vizinhos, culpem o destino ou o agente imobiliário, e são colegas de trabalho. Mas algo destoa entre os dois: o Ricardo é solteiro e a Rita casada. Casou-se há um ano com alguém que conheceu há dois. Pois, ele também partilha da vossa opinião: “Mas que apressados!” Ricardo nunca conseguiu exprimir o que sentia por Rita, e continua a fazer o que disse, a “arrastar-se de amores” por ela.

Não lhe permanece totalmente fiel, lá vai tendo namoradas, mas tudo muito supérfluo, nada que se compare minimamente ao amor por Rita.

 

 

Capítulo III – “Stress” Laboral

 

 

- Oi, senhora Rita Pires! – diz Ricardo num tom sarcástico.

- Boa tarde Ricky! – saúda-o ela, sempre bem disposta e com um tom de voz radiante.

 

“Como eu adoro a sua voz!”

- Está tudo bem contigo? – aprofunda ele a conversa.

- Sim…sou casada e feliz…tenho um bom trabalho e bons amigos… - diz ela.

 

“Noto alguma falsidade nesta frase. Se eu estivesse a escrever isto, empregaria umas quantas reticências; ela não sente o que diz e não diz o que sente…Será?”

- Passa-se alguma coisa? – interessa-se ele.

- …Não…porque se passaria algo? – hesita ela.

- Não sei Rita…por isso pergunto-te…

- Não te preocupes. – diz ela antes de lhe beijar na face despedindo-se dele.

 

“Ela mente…é-me óbvio! Mas o que se passará então? Será que é alguma coisa no trabalho? Não, a Rita sempre foi cheia de vida, não era apenas “stress” laboral que a ia deitar abaixo. Então se não é no trabalho é no casamento…Será o marido dela infiel? Se ele o for apenas me vem confirmar a sua estupidez…nunca que ele encontrará alguém sequer minimamente parecida com a Rita! Ela é única em todos os aspectos. A meus olhos ela é perfeita…perfeita no meio de uma espécie humana toda ela imperfeita…”

 

- Rita, espera! – chama-la Ricardo.

- O que foi agora?! – levanta ela o tom de voz.

- Eu sei, por todos os anos que te conheço, que alguma coisa de errado se passa contigo, e parte-me o coração saber que tu não confias em mim o suficiente para desabafares comigo! Tu sabes, desde há muito tempo, que eu estarei sempre ao teu lado. Procura-me para o que tu quiseres…

- Oh Ricardo…Ricky… - esboça ela um sorriso breve – nem tu imaginas a gravidade do que me apoquenta…como fui estúpida… - e ao dizer isto, o sorriso esmorece e transforma-se num choro desesperado.

- Rita…nunca te vi desta maneira…que se passa? O que tens? O que te preocupa? – ele também entra em desespero ao ver o seu amor secreto a esvair-se em lágrimas.

 

“É agora…Tem de ser agora! Serei eu assim tão cobarde para passar 10 anos a amar uma pessoa e não lhe exprimir o meu sentimento!? Terei eu de recorrer mais uma vez a um bilhetinho?! Quem sou eu?! Eu nem me reconheço mais…Vou acabar isto de uma vez por todas porque senão nunca que conseguirei continuar a viver sabendo que a única pessoa neste mundo que eu amo está infeliz! Não vou aguentar saber que aquela doce menina, que veio falar comigo na primária, não tem metade da felicidade que ela merece! Não me vou conseguir olhar no espelho de manhã ao saber que a rapariga que sempre esteve ao meu lado quando eu mais precisava, chora pelos cantos como se não houvesse um amanhã!

Ela, que foi a única que veio falar comigo, e graças a ela fiquei imediatamente muito mais descontraído! Ela, que sempre me fez sentir bem nos momentos em que isso parecia impossível! Ela, que foi a única que me consolou quando mais um namoro meu não funcionava! Ela, que foi, durante alguns anos, a única pessoa que me passava a cara pela mão, porque todos os outros tinham nojo das borbulhas! Ela, que foi a única que me incentivou a seguir um curso de comunicação social e graças a isso, hoje trabalho numa rádio! Ela, que foi a única que me ofereceu o seu ombro para chorar a morte da minha avó…e ainda hoje o faz…porque eu ainda hoje o faço…

Se eu não faço isto agora nunca mais farei nada na minha vida, porque ela, a minha vida, perderá todo o pouco sentido que tem ou que alguma vez teve…

Mesmo que eu saia daqui pior do que aqui cheguei; mesmo que ela me diga não; para sempre estarei de consciência limpa, pois quando a altura chegou eu tive a coragem de acabar com isto tudo, que já se prolonga por demasiado tempo…por demasiada tinta…”

 

- Rita…olha para mim. – diz ele, gaguejando – Sabes o que vejo neste momento?

-O quê? – pergunta ela, soluçando.

- Uma menina doce, assustada porque o disfarce da rapariga forte foi desfeito. Uma rapariga linda que faz qualquer um sorrir apenas com o seu sorriso, apenas com os seus cabelos de ouro, apenas com o seu toque de veludo, apenas com a sua voz de mel…Uma mulher que faz qualquer um tremer com a sua silhueta; que faz qualquer um cair a seus pés ao deslumbrarem tamanha beleza, tamanha elegância e suavidade! Tu…tu não és humana, não o podes ser, pois eu, que já vi muita gente, nunca que me tinha deparado com tamanha perfeição…uma perfeição sublime; uma redundância: uma perfeição da mais perfeita que pode existir!

 

A única resposta que ela consegue dar a este discurso todo é corar e algumas lágrimas que lhe começam a correr pelo rosto. Ele continua sem nunca hesitar; nunca esteve mais determinado, mesmo sem perceber de que tipo são as lágrimas – alegria ou tristeza.

 

- É assim que eu te vejo, e como me enlouquece quem não te vê desta forma! Nem mesmo um cego pode dizer o contrário disto tudo porque apenas com a audição percebe a tua perfeição pela voz…pelo toque e pelo teu cheiro, porque tudo isso é perfeito em ti! É quando olho para ti que realmente acredito em Deus! Porque só umas mãos divinas conseguiriam fazer algo tão belo…algo tão puro mas ao mesmo tempo sensual…algo tão doce.

 

Ela cora ainda mais, e agora ele percebe de que tipo são as lágrimas graças ao sorriso que começa a rasgar a face dela.

 

- E, abreviando, o que eu quero dizer, com este discurso apaixonado, é precisamente o que se pode ler nas entrelinhas e ouvir nos gaguejos…Eu amo-te Rita e percebo agora que desde a primeira vez que te vi, naquela sala primária, que te amo. Já há 20 anos que te amo, mas desde sempre que me tentei enganar e dizer o contrário por pura cobardice. Por puro medo de dizer isto tudo a um anjo! Contigo tudo fica mais claro, mais simples, mais belo. E logo na primária eu me apercebi disso, mas acho que por causa da admiração da descoberta não quis acreditar que assim fosse. Perdoa-me…

- Perdoar-te porquê? – lá responde ela a este discurso dele, depois de conseguir recuperar o fôlego, depois de parar de soluçar.

- Perdoa o meu “timing”. Só agora, que tu estás casada, é que te digo tudo o que já sabia há mais de 15 anos…

- Oh Ricardo…Ricardo! – exclama ela para ele enquanto lhe põe as mãos na cara e se aproxima dele, já a chorar de felicidade.

 

E depois de tanto tempo, o beijo ocorre. Tudo pára para os dois. Ricardo vê a sua vida a passar-lhe à frente dos olhos e percebe agora todos aqueles momentos que tinham ficado enevoados na sua memória, nos quais Rita lhe tentava mandar sinais sublimes, como tudo o que a mulher faz, a ele.

 

 

“Agora descobri o que me faltava; o que me faltava na alma; o que me faltava dentro de mim mesmo logo ao nascer. Entendo tudo de uma outra forma: Todos nós nascemos incompletos, alguns apercebem-se disso e outros não. Eu tive a sorte de me aperceber disso assim que nasci. O nosso objectivo de vida é encontrarmos o “pedaço” de alma que nos falta…o “pedaço” de nós que foi-nos retirado antes de nascermos. Para sobrevivermos por todas as fases piores da vida precisamos de ter um objectivo interior e maior do que todos os outros. Um objectivo tal que nos possa servir de amparo para quando estamos prestes a atingir o fundo mais tenebroso e obscuro possível!

Com este beijo, percebo agora que atingi o meu! Encontrei o pedaço que me faltava, e que, ironicamente, sempre esteve a meu lado.

Obrigado avó! Deves ter tido algo haver com isto, só assim se explica a forma como a Rita e eu permanecemos sempre nas mesmas turmas, sempre vizinhos apesar de ambos nos termos mudado…Como fui cego!

A minha felicidade esteve sempre a meu lado a sorrir para mim!”

 

 

Depois deste encontro, Rita acabou por se divorciar. Ele e ela ficaram juntos, casaram-se e tiveram um filho.

Escusado será dizer que viveram felizes…não sei se para sempre mas pelo menos até hoje.

Hoje em dia são ambos uns avós babados e pais orgulhosos do seu filho. O filho deles, também chamado Ricardo, é um escritor de sucesso, que decidiu escrever a bela história do amor verdadeiro entre os seus pais.

Ela e ele passaram a ser um só, e até hoje o são, como que uma música romântica no …fim…


sinto-me:

publicado por Sr. Dr. Ricky às 17:44
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De Andreia a 24 de Abril de 2006 às 23:35
ahhhhhhh uqero mais entao???? -_- oh *


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